quarta-feira, janeiro 17, 2007

"Pau neles! Companheiros!"
Theodoro Botinelly


Por um exorcismo dos "Anos 80"

Somos seres repetitivos. Fazemos as mesmas coisas (ou boa parte delas) todos os dias. A repetição toma conta da nossa vida transformando-nos em pêndulos. Pêndulos que guardam no interior do espaço que se compreende entre o "pra lá" o e "pra cá" tudo aquilo que chamamos de "rotina", mas na verdade a nossa vida conseguiu romper com a força do estático e adquirir o movimento, porém como ainda não aprendemos a lidar com esse movimento, assumimos de um modo geral a figura do relógio da sala, que se movimenta ali, parado junto a parede. Uma ilusão de movimento ? Uma ilusão de mudança ?
Atletas repetem seus exercicios para ver se conseguem, ali adiante, fazer o mesmo exercício repetido de forma melhorada. Professores repetem conteúdos já dados. Políticos repetem os mesmos discursos. Os pais repetem os mesmos erros. Os analistas repetem as mesmas análises. O cozinheiro repete a mesma receita. Médicos repetem as mesmas operações e os mesmos diagnósticos. Músicos repetem a mesma nota. Juízes repetem a mesma sentença. Poetas repetem as mesmas rimas e as mesmas imagens. A Globo repete os mesmos filmes. Roberto Carlos repete o mesmo show todo ano. O Porão do Alemão (para quem vive em Manaus) repete sempre as mesmas musicas. O SBT ainda repete o Chaves...os dias se repetem, as épocas se repetem.
Diante do nada, de um horizonte vazio onde o olhar nada encontra, nos resta olhar para trás e repetir, repetir e repetir. Tocar um foda-se à repetição é uma arte genuína e única. Não é uma mera revolta adolescente, pois revoltas assim costumam se repetir na adolescência, tanto que já estão devidamente catalogadas nos compêndios de 300 páginas da psicologia juvenil e afins. Tocar um foda-se não é como tocar uma punheta, e se isolar em um mundo fictício onde você tem acesso a quem quiser no lugar onde quizer, pelo menos até o momento do gozo para cair de queixo de volta à repetição. Tocar um foda-se é essencialmente quebrar o círculo niilista e repetitivo que toma nossas vidas de assalto com o nosso próprio consentimento, a partir da nossa própria escolha. Talvez, após quebrá-lo, apareça um novo horizonte em sua janela.
E os anos 80 ? Bem, eles hoje representam uma fórmula que é repetida em vários lugares do planeta. Não a tôa, a Dreamworks vai trazer os Transformers e a Mattel relançou o He-Man e os Comandos em Ação e vem se mantendo fiel à repetição da boneca Barbie desde a revolução juvenil (após 2ª guerra, Hobsbawm em a Era dos Extremos). Hollywood parece ter se esgotado no quesito criatividade evidenciado a partir dos remakes de filmes dos anos 70 e 80 e sequências desesperadas (p.exemplo: Efeito Borboleta 2, pra quê? Indiana Jones 4! UAU!).
Várias festas Brasil a fora "bombam" ao som dos anos 80, Kid Vinil, Léo Jaime, Ritchie, Almanaques e sites do gênero "bombam" também, pois despertam o sentimento nostáugico e saudosista de uma época "sempre" melhor. Até o gosto dos chocolates da Nestlé era melhor! Não vou jogar balde de água fria na nostalgia de ninguém, afinal eu mesmo tenho as minhas guardadas aqui dentro do peito, como amigas que, vez por outra, eu faço uma visita, mas não fico infurnado nelas, imerso nesse sentimento que nos puxa para trás e toma conta do nosso futuro conduzindo-o à repetição (quantas vezes eu já repeti essa palavra aqui ?).
Uma dessas memórias amigas dos anos 80 que sempre faz surgir um sorriso neste meu rosto pálido de fantasma é a de um muro na Av. Tarumã esquina com a Major Gabriel, neste lugar havia na época uma dessas lojas de veículos que são bem comuns na praça 14, hoje há nesta esquina um banco Itaú a novinho em folha. Bem, alma dessa minha memória amiga que me faz rir quando a encontro concentra-se na seguinte frase pichada naquele local: "Pau no cu do Botineli".
Theodoro Botinelly (o nome certo é com Y e com dois L´s, no muro estava pichado errado, evidentemente) o "Botica" , para quem não sabe, foi um candidato do PDT no início dos anos 80, onde enfrentou o candidato da situação Manoel Ribeiro. A célebre frase "Pau neles companheiros!" era de sua autoria e rolava em pleno horário eleitoral, e para nós, crianças à epoca, funcionava como um grito de guerra. O querido "Botica" era a voz da oposição contra o sistema, bem no estilo "Nós" contra "Eles". Ele foi vencido nas urnas pelo Manoel "Pracinha" Ribeiro, mas sem dúvida entrou para a história da política manauense. O seu grito de guerra nos marcou de tal forma que ele fazia falta nas eleições posteriores. Anos se passaram e certa vez ouvi alguem dizer que ele havia se vendido e se calado, por isso não ouvíamos mais o "Pau neles companheiros!". Posteriormente eu soube que ele havia falecido.
Com todo respeito a ele, a frase no muro era engraçada sim. Mas além disso, ela era reveladora também, pois mostrava naquela época que o humor sarcático e a acidez da frase original incomodava muito mais, sobretudo aqueles que compactuavam com o gupo que se estendeu por mais de 20 anos no poder: os possiveis pichadores.
Assim, cumpre dizer: Pauladas na "repetição" que nos toma a vida e nos lança ao vazio!!

4 comentários:

Anônimo disse...

Essa merda de repetição dos anos 80 que aqui em Manaus se faz presente principalmente nos tributos que algumas bandas ditas de rock fazem para movimentar a nossa vida noturna (vixe,vixe! como bem diz o Taqui pra Ti) já esgotou a paciência e mostra o quanto nos falta em criatividade.
Com todo o respeito que tenho com o caso entre He-Man e o Esqueleto,à estupidez simpática da Barbie, ao video-game e outras quinquilharias que nos fizeram rir pra caramba, eu não agüento mais esse saudosismo.
Quanto ao Botinelly, tomara que seu inconformismo tenha deixado algumas sementes, pois se tivéssemos enfiado o pau nos anus 80 deles talvez hoje essa cidade fosse menos pior.

Anônimo disse...

Solta os cachorros toinho!

Anônimo disse...

Muito bom! E sua memória é excelente!
Ultimamente tenho a impressão que a cidade só se repete! Mas de uma maneira "minimalista". Basta ver os buracos nas ruas, os enfeites de Natal (ainda em cartaz), as teses, argumentos e justificativas das pessoas públicas!

Anônimo disse...

NOOOOOOsssa! Eu lembro disso! LEmbro bem desse muro! Caramba voce me fez voltar no tempo. Se fosse hoje alguém irira tirar uma foto com o celular. eu não tenho saudades dos anos 80 mas tenho dos anos 70 engraçado é que isso ai seria saudades do que não vivi!